terça-feira, fevereiro 10, 2004

As aventuras de Johny X - Cap III
_Telefone público em Diadema?? É claro... o cara não usaria um telefone que pudesse ser localizado – lamentava Johny, cada vez mais angustiado.

Ele realmente não sabia o que fazer. Estava totalmente desnorteado. Pensou em ligar para a polícia: “Mas vou dizer o quê? Que alguém me ligou avisando que vão me matar? E eles vão poder fazer o quê? Provavelmente dizer que foi trote. O que também é possível...”
Ficou pensando em quem teria mau-gosto suficiente para fazer uma “brincadeira” dessas. Ninguém lhe ocorria. Achava que mesmo os mais sacanas do departamento, que já haviam até providenciado telegramas falados com drag queens e outros trotes, não fariam uma coisa dessas. Mesmo eles... E depois, havia uma autenticidade naquela voz, uma quase raiva, que ator nenhum conseguiria interpretar. E ainda, o telefonema aconteceu no começo da manhã e agora o dia já estava acabando, é provável que se fosse uma “pegadinha”, o autor já tivesse aparecido para tirar uma da “cara pálida” dele.

Luca, seu melhor amigo, havia viajado para a Patagônia. Pensou em conversar com a sua mãe, mas não quis preocupá-la. Pela primeira vez em muito tempo, se sentiu sozinho. Alguém estava de olho nele e ele não sabia quem e nem porque. Se é que essas coisas precisavam de motivo...

Sete e meia, oito. Oito e meia da noite e ele ainda estava no escritório. Até o pessoal da faxina já havia ido embora e ele continuava lá, enrolando, com medo de voltar prá casa. Ficou pensando no que fazer. Decidiu mudar o caminho, para despistar. Depois, cogitou passar a noite em um hotel. “Pera lá, assim também já é demais.”

Respirou fundo, tomou coragem e decidiu ir para casa mesmo. Pegou o elevador e desceu até a garagem onde estava seu carro. Já passava das nove da noite e a garagem estava praticamente deserta e muito pouco iluminada. “Droga”, pensou. Viu seu carro solitário na outra ponta do estacionamento. Esperou um pouco, deu uma boa olhada em volta e disparou a correr. A sola de madeira do seu sapato ecoava pela garagem. Destravou a porta do carro a certa distância, abriu, jogou sua pasta no banco do passageiro e trancou as portas. Suspirou de alívio e de cansaço pela corrida. Seus níveis de adrenalina estavam quase baixando quando seu coração quase sai pela boca. Bateram no vidro do seu carro. “É agora”, ele pensou.
Mas não era. Gilmar, o zelador da garagem, “ouviu” a corrida de Johny e foi verificar se estava tudo bem. ‘”É que estou meio atrasado“, disse meio sem jeito. “Acho que estou é ficando paranóico”.

Mas por via das dúvidas, fez outro caminho. Dirigia com a respiração presa de tão tenso que estava. Olhava constantemente para os lados e não parou em nenhum sinal vermelho. Quando avistou, ao longe, o prédio em que morava, sentiu uma indizível felicidade. Como se aquele fosse o seu forte-apache onde estaria protegido.

Buzinou discretamente para o porteiro. Mais para chamar sua atenção do que propriamente para cumprimentá-lo. Outra garagem. Essa pelo menos estava iluminada. E a sua vaga ficava mais próxima ao elevador. Subiu. Destrancou a porta. Quando acendeu a luz notou um envelope no chão. Achou que fosse propaganda de alguma coisa, as pizzarias delivery faziam isso constantemente no prédio. Mas não era propaganda, nem de pizzaria, nem de algum político pedindo votos. Dentro do envelope havia uma carta, feita em computador e, pelos pequenos borrões, impressa em alguma antiga impressora jato de tinta. A carta dizia:

É, playbói vacilão, a casa vai cair prá você se você não ficar esperto. Nem sei porque tô te dando esse toque, porque otário que nem você tem que se fudê mesmo. Fica aí no seu mundinho, totalmente sem noção da real que é a vida da maioria das pessoa. Eu só tô perdendo meu tempo com você, seu mané, não é de pena, não... é que tem um lance que me faz o sangue subir mais que tudo na vida, que é trairagem. Vou te avisar de novo: se liga, seu bosta.

Johny sentou no seu sofá iraniano. Não tirou a gravata, nem os sapatos – sua primeira providência, sempre que chegava em casa – não buscou a garrafa do seu xará Johny Walker, nem ligou sua tv de plasma ou seu super aparelho de som. Ficou apenas sentado, imóvel, paralisado. Horas a fil pensando o que havia feito de errado para merecer aquilo.

continua >>