quarta-feira, dezembro 10, 2008

Ashton, o Homem Sem Medo - Deus do Voleibol

Ashton, o lendário Homem Sem Medo, caminhava em peregrinação pelo majestoso Deserto do Atacama em busca de auto-conhecimento e também da lendária Cidade dos Deuses, que teria desaparecido sob uma monumental tempestade de areia há cerca de 3000 anos. Por dias e noites, guiado apenas pelas estrelas e por seus instintos, Ashton caminhou e caminhou por milhares de quilômetros.

Eis que de repente, ao longe, Ashton visualiza o que parecem ser figuras em movimento.

É comum o deserto pregar essas peças, pensa ele, mas à medida em que avançava, aquilo que parecia tratar-se de uma miragem ia ganhando formas, cores e sons cada vez mais nítidos.

Até que a cena se tornou inconfundível: era uma quadra em pleno deserto, onde algumas pessoas jogavam vôlei. Uma enorme platéia assistia, em silêncio, à partida.

Não vão pensando que a quadra era de areia só porque ficava no meio do deserto. Na verdade, o piso era de taraflex, havia antenas na rede, suportes forrados com espuma para evitar choques e, apesar do local ser aberto e estar à luz do dia, uma grande estrutura de iluminação, com postes altos e dezenas de lâmpadas brancas que emitiam um brilho fortíssimo.

Ashton logo percebeu que havia homens e mulheres em quadra e que um dos times tinha apenas 5 pessoas, enquanto o outro tinha 6. Assim que adentrou propriamente a cena, o jogo foi interrompido, um silêncio se instaurou e todos os olhares se voltaram para ele. Ashton levantou o olhar levemente sob a aba de seu chapéu, deu uma panorâmica em toda a volta. As arquibancadas agora pareciam muito maior que antes.

Foi então que uma das jogadoras, uma loira belíssima de postura altiva, gritou em sua direção:
- Finalmente o lendário Homem Sem Medo!... Estávamos à sua espera. Entre e ocupe o seu lugar!, disse apontando para o outro time.

A mulher de aparência jovem e longos cabelos presos num rabo-de-cavalo tinha um número 4 gravado em dourado em seu uniforme e era na verdade Rosiz, a deusa aymara do voleibol.

Um outro jogador, no entanto, gritou em protesto:
- Ele não pode adentrar à quadra sagrada! Olhem, ele sequer usa calçados adequados!

O público emitiu um oooh!!! contido...

Ashton fitou o homem de cabelos negros, mas nada disse. Ele peregrinava pelo deserto já havia vários meses e suas botas realmente estavam em péssimo estado. Embora não fossem propriamente velhas, estavam totalmente cobertas pela areia avermelhada. A sola havia descolado em alguns pontos e as palmilhas tentavam saltar para fora, aparentando línguas que se arrastavam pelo chão.

Num flashback, Ashton se lembrou de sua infância pobre, quando jogava com laranjas, descalço, pelas ruas de Trinidad. Desde aquele tempo, ele sofria discriminação dos outros meninos, que não o deixavam jogar com eles.

De volta ao presente, Ashton, o Homem Sem Medo, novamente não se intimidou. Puxou as línguas das botas para fora e as colocou em um canto, junto com sua mochila, seu cajado e seu chapéu. Caminhou em direção à quadra, mas apalpou o bolso da calça e retornou para deixar também seu celular da Oi.

Tornou a caminhar para a quadra em passos firmes, fitando os olhos de Rosiz. Assumiu o lugar na quadra e emitiu suas primeiras palavras em meses:
- Let's play! - a voz saiu um tanto grave pela falta de uso.

O juiz imediatamente soprou seu apito e o burburinho do público se intensificou.

Rosiz segurava a bola na posição de saque, deu alguns passos para trás e bateu algumas vezes a bola contra o chão. E então a arremessou ao alto, deu dois passos e projetou seu corpo esguio no espaço como se estivesse no vácuo e sem gravidade. Golpeou a bola violentamente, que atravessou a quadra e explodiu forte nos braços de Ashton, indo para fora.

O público foi ao delírio, gritando e aplaudindo efusivamente. Ashton percebeu que a pancada deixara uma grande marca vermelha em seus braços, mas ainda assim, não se intimidou. Bateu levemente em suas vestes para retirar o excesso da poeira avermelhada acumulada pela viagem e novamente se colocou em posição de recepção.

Um novo saque partiu violento, mas Ashton o recebeu com perfeição, mandando a bola nas mãos do levantador. A bola é então alçada ao alto para Ashton, que parte em velocidade e salta em direção à rede. Ele golpeia a bola com força, cravando-a na quadra adversária, poucos centímetros à frente de Rosiz. Seus olhares novamente se cruzam crispando uma antipatia mútua.

O jogo segue em altíssimo nível, Ashton enfrentava seus adversários sem nenhum temor, atacando, defendendo, bloqueando e passando com perfeição. Rosiz e sua irmã Roselva, no time adversário, também viravam todas as bolas fosse da rede, do fundo, pela entrada ou pela saída...

O calor intenso da região mais árida do mundo castigava e desidratava seu corpo, mas Ashton permanecia firme, como se sentisse que tinha uma missão a cumprir e que todo o futuro do voleibol dependia daquele jogo.

Ashton logo percebeu também que nenhum de seus companheiros de equipe possuía um nível técnico razoável, enquanto que, do outro lado, todos jogavam de maneira homogênea e muito eficiente em todos os fundamentos. Isso tornou a odisséia de Ashton ainda mais árdua, mas isso serviu também para fortalecer seu espírito.

O jogo seguiu duro, porém muito equilibrado, até o tie break. Rosiz não acreditava no que via. Jamais havia perdido uma partida antes, jamais havia sequer chegado a um tie break, afinal ela era a deusa do voleibol.

Desde que ouviu a lenda de Ashton pela primeira vez, sabia que precisava desafiá-lo. Afinal, seus seguidores também ouviram falar da lenda e começaram a se perguntar sobre quem seria de fato a maior entidade do voleibol a caminhar sobre a Terra.

O tie break foi disputado ponto a ponto até chegar a 14 a 14. Ashton foi para o saque e lançou uma bola tática, sem peso, bem próxima à rede, tentando surpreender os receptores que se postavam mais ao fundo. Roselva, no entanto, deu um mergulho e passou a bola na pinta para o levantador, que saltou para encurtar a distância da bola. Rosiz partiu rápido junto com a bola e saltou antes mesmo da bola chegar às mãos do levantador. O rapaz então tocou com rapidez, encaixando a bola perfeitamente na trajetória do braço de Rosiz que já girava em incrível potência pelo ar. Rosiz cortou; a bola acertou Ashton no ombro direito com tamanha fúria que o derrubou para trás e a bola se perdeu no nível mais alto da arquibancada.

A torcida, tensa, explodiu em vibração. 15 a 14. Faltava apenas mais um ponto para Rosiz sagrar-se definitivamente como a incontestável deusa do voleibol.

Rudy, o jogador de cabelos negros que havia reclamado dos sapatos de Ashton, foi ao saque. Ele saltou e sacou forte na direção de Kusco, o jogador mais fraco da equipe. Kusco recebeu mal e a bola espirrou para trás. Asimo foi buscar, mas, apavorado, deu um passe mal-feito, quase lançando a bola direto ao chão. Ashton mergulhou e, com a ponta dos dedos, conseguiu evitar a queda da bola lançando-a sobre a rede em direção à quadra oposta. Tamanho foi o assombro pelo salto espetacular de Ashton, que Roselva e Bruni, num momento de indefinição, deixaram que a bola caísse entre os dois. 15 a 15. Rosiz ralhou violentamente com os dois.

Ashton foi ao saque. Ele partiu rápido como o vento que corta o deserto e voou por sobre a linha atingindo a bola numa altura espetacular. A bola cruzou lisa pela quadra e raspou a linha adversária. Ace.

Ashton foi novamente ao saque. O derradeiro ponto poderia novamente sair de suas mãos. Ashton, então parou e olhou para a arquibancada ao seu redor. Sentia que a torcida estivera o tempo todo ao lado de Rosiz, porém sentiu medo em suas faces. Muitos vibravam vendo suas incríveis jogadas, mas se continham. Rosiz provalmente obrigava que a adorassem. Ele então repousou a bola ao chão com delicadeza e começou a bater palmas, ditando um ritmo. Timidamente, a torcida começou a acompanhá-lo.

O juiz apitou com força, obrigando-o a sacar. Ashton pegou a bola, mas a torcida continuou a marcar o ritmo cada vez mais forte. Um trovão ecoou no céu. O público estremeceu de pavor, pois não ocorrem trovoadas no deserto, mas sentiu que deveria continuar no ritmo.

Ashton lançou a bola ao ar, correu e decolou. O movimento perfeito da alavanca corporal golpeou a bola com a força de 10.000 catapultas. A bola voou como um projétil, tão rápida que quase sumiu no ar, e atingiu o rosto de Rosiz sem chance de defesa. A bola subiu tão alto que sumiu de vista. E um novo trovão ecoou no exato momento em que todos olhavam para cima procurando a bola, que não desceu.

Fim de jogo, mas a torcida ainda prendia a respiração. E o milagre finalmente aconteceu. Gotas de chuva começaram a cair de um céu sem nuvens no deserto mais seco do mundo.

Ashton abriu os braços e deixou que a chuva banhasse seu corpo, abençoasse sua alma e refrescasse seu espírito. O público, em êxtase, invadiu a quadra para aclamá-lo.

Um novo estrondo se ouviu, mas dessa vez não era um trovão. A chuva que agora caía torrencialmente fez deslizar uma grande duna ao norte revelando as ruínas da Cidade dos Deuses, cujo símbolo era uma grande árvore. A lenda rezava que a Cidade dos Deuses guardava o segredo do Voleibol Perfeito, mas Ashton finalmente descobriu que esse segredo estivera guardado o tempo todo dentro de si. Agora ele o descobrira, tal qual a duna que descobriu a cidade.

Enquanto ainda contemplava a beleza das ruínas, ouviu uma doce voz.
- Você me venceu de maneira justa. Você é o verdadeiro deus do voleibol.

Era Rosiz, que se prostrava humilde diante do Homem Sem Medo. Ashton levantou-a pelos braços e fitou seus olhos. Não sentia mais a inimizade de minutos atrás, mas apenas ternura e admiração. E, em tom grave, fez soar sua voz pela segunda vez no dia:
- Yeah, baby...

FIM

2 Comentários:

Às 8:55 AM , Blogger alex-J disse...

Isso não é um post, é uma saga, uma epopéia!! Assim nascem as lendas... E eu não estava lá...
Os deuses do voleibol devem estar bravos comigo, pois não tem permitido a minha entrada na quadra...

E que blz de layout novo, hein!!

 
Às 2:32 PM , Anonymous Anônimo disse...

layout minimalista...

 

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