terça-feira, abril 27, 2004

O Balanço

Há pouco mais de um ano o R3x escrevia sobre umas viagens alucinógenas movidas a doses cavalares de aulas de spinning. Ontem, depois de ter corrido um pouco na esteira, me ajeitei no colchonete para fazer uns abdominais. Confesso que já apaguei algumas vezes nessa posição, dormi mesmo. A sala de ginástica não é o local mais freqüentado do prédio, então com freqüência sou o único presente. Ontem, estava meio cochilando, meio resistindo quando me veio na cabeça, quase pronto, o seguinte conto:


Um homem da cidade, por volta dos 40 anos, visita o primo de mais ou menos a mesma idade em uma fazenda no Nordeste.

Numa tarde abafada, o visitante senta num grande balanço de madeira, instalado em uma espaçosa varanda com ampla vista para uma imensidão de verde. O balanço é preso por uma corrente que range conforme o movimento. O visitante quer ser gentil, arruma um pouco de óleo e lubrifica o suporte onde a corrente esta presa e que produz o barulho. Ele conta orgulhoso ao primo anfitrião:

_Primo, estava aqui a toa e resolvi consertar seu balanço.
_Consertar? – Espanta-se o primo – Não sabia que tinha quebrado...
_Sabe aquele barulhinho chato que fazia quando a gente se balançava? Então... não faz mais.
_Não faz mais?? Perguntou o dono do balanço visivelmente transtornado. E foi explicando:
_ Olhe, primo, sei que você agiu com boa intenção, mas o caso é que você estragou o balanço.
_O quê? Estraguei?? – perguntou o primo, incrédulo.
_É que para mim, o gostoso desse balanço era justamente essa musiquinha que ele fazia... sempre constante e regulada com a velocidade do movimento. Chegou a reparar como era essa musiquinha? Começava com um rangido sofrido, misturado com um assobiozinho bem de leve e depois, um estalo: téc! Para depois começar de novo...
Sabe, enquanto eu ficava aqui me balançando, olhando prá esse mundão de Deus, esse barulhinho parecia que me transportava prá outras bandas, é como se ele me isolasse do resto do mundo. Sabe como é, primo?

O primo da cidade que foi ficando cada vez mais constrangido com a narrativa, só conseguiu dizer:

_Ah, primo me perdoe... Não imaginei que... Mas será que tem alguma coisa que a gente possa fazer para deixá-lo como era antes?
_Não se avexe não primo. Quando o balanço foi feito, ele também não fazia barulho. Ele foi vindo com o tempo. Então, vamos deixar que o tempo resolva isso de novo.
_Mas demorou muito?
_Bom, o balanço foi feito quando a Ritinha nasceu e agora ela está com dezenove anos...
_Dezenove?? E demorou quanto tempo para ficar com esse barulhinho?
_Sei não... Acho que quando ela tinha uns cinco ou seis anos o balanço já cantava bonito...

Músicas, barulhos, referências... diversidade.

segunda-feira, abril 19, 2004

Post produzido de post reciclado. São tantas possibilidades...

Nas Ruas

É começo de noite e o tempo está frio e úmido em Sampa. Eu e uma mini multidão aguardamos o sinal de pedestres esverdear para atravessarmos a Consolação rumo à Maria Antonia. Percebo que a mini multidão é formada basicamente por alunos do Mackenzie. Reparo em uma estudante usando boina e óculos de armação preta e grossa. Ela carrega alguns livros e uma revista estrangeira à mostra. Está fazendo pose de intelectual, pensei.

Vou seguindo pela Maria Antonia. Mais estudantes: cabeludos; carecas; de piercing; de gravata; risadas; beijos na boca. O clima de faculdade me agarra e não quero mais sair dessa rua. Mas eu resisto e sigo andando.

Começo a observar melhor as pessoas que passam em direção contrária. Começo a encará-las. Quero descobrir quem são, tentando imaginar suas histórias. Todas desviam o olhar. Esse tipo de atitude incomoda... De repente, uma garota não desvia, parecendo me desafiar. Será que ela já estava me observando? Ela não é bonita. Não consigo identificar se é estudante, ou se como eu, está só de passagem. Estranho, também não consigo estimar sua idade. Ela continua olhando dentro dos meus olhos. Sem diminuir o ritmo das passadas ela passa por mim em slow motion, encarando, desafiando, querendo ver dentro de mim. Depois que ela passa, fico tentado a olhar para trás, mas não olho. Apenas sigo adiante, agora descendo a Dona Veridiana em direção ao Largo Santa Cecília. Uma fina garoa começa a cair. Acho que é a tal garoa da terra boa...

O volume de pessoas diminui e escondidas sob seus guarda-chuvas, não posso mais alcançar seus olhos. Meu foco então se desvia para cima e vejo uma silhueta na janela de um apartamento. Apesar de não saber se homem ou mulher, a figura me aparenta ser idosa. Sinto que está ali, como eu, olhando as pessoas passarem, e talvez... pensando em quem são.

Os protagonistas transeuntes seguem sem perceberem nada. Não se dão conta que provavelmente suas histórias possam estar entrelaçadas em algum ponto do passado ou do futuro (no presente já estão). Mas as pessoas não pensam sobre isso. De fato, nesta cidade, é bom não pensar em várias coisas: é bom não pensar no tempo incrível que se perde nos deslocamentos por causa do trânsito; na violência que nos espreita; ou na falta de perspectivas a médio prazo para a resolução destes problemas... E graças a essas coisas e também aos abundantes serviços deliverys, vamos indo, cada vez mais, para dentro. Cada vez mais, acuados, prisioneiros voluntários em nossas casas, ou escondidos nos automóveis de vidros escuros que também viraram extensão dos lares. Sim, é melhor não pensar em muita coisa sobre essa imensa, estranha e sedutora cidade.

Divagando sobre isso, não presto muita atenção para atravessar a rua. Um carro buzina e o motorista me xinga. Do outro lado, uma pessoa se oferece para ajudar a atravessar um deficiente visual. Mais adiante, um travesti caminha lentamente em direção a Amaral Gurgel para iniciar seu dia (noite) de trabalho. Mais buzinas: um ônibus fecha um cruzamento. Dentro de um carro, uma mulher solitária canta. Tento adivinhar que música está saindo de seus lábios mudos. De repente, um menino de rua, gruda em seu vidro. Da distância que estou, não consigo ver se é assalto ou não. Prá variar, ninguém próximo se manifesta. É como se ela fosse invisível. Então, eu lembro de um trecho da música Speed Racer do Herbert Vianna: “A vida nem sempre é boa/ a vida nem sempre é boa...”.

Mas eu sigo andando. E arrisco uns versos:

amor e ódio
sonho e pesadelo
yin e yang
o anti-modelo

quinta-feira, abril 08, 2004

Diário de um papai fresco - III
Em casa, seu primeiro cantinho prá descansar foi mesmo a nossa cama. Apesar de quase tudo preparado, o berço ainda não estava com os lençóis e protetores devidamente colocados etc etc...
Chegamos por volta do meio-dia e logo chegaram os pais da Cris, com o nosso almoço, prá dar "aquela" mão.

Essa parte da ajuda dos avós é realmente um capítulo à parte, pois, meu, como o pequenino consome as nossas energias! A princípio, esse novo ritmo de vida (de uma em uma hora!) me pareceu coisa de Amyr Klink navegando sozinho pelo Atlântico, como lembrou o já experiente Alex-J. A sensação de que vc está sempre com o prazo vencido é constante e demora um pouco prá organizar tudo e deixar as coisas minimamente preparadas para a próxima hora. Enquanto isso, ele mama e dorme...

À tarde, aproveitando que a minha sogra estava em casa, lá foi o papai em mais uma missão que só cabe mesmo a ele: comprar uma série de itens que faltavam. De lixinho e garrafa térmica, algodão em bolas, gaze, sabonete líquido até protetores para os seios (acho que comprei todos os modelos disponíveis), voltei prá casa trazendo até uma luminária emprestada pela Dra. Cecília para ajudar também na cicatrização dos mamilos. Aliás, essa foi uma dica sensacional.

A primeira noite em casa foi realmente prá nunca mais esquecermos. Parece que a natureza faz de propósito: a experiência tem que ser suficientemente traumática e intensa para que vc nunca se esqueça o que é ter um filho. O André chorando desesperado num volume altíssimo e o pai desesperado na cozinha tentando ferver as mamadeiras!

Na quinta, chegaram os meus pais. O avós do interior estavam ansiosos prá conhecer o netinho. Logo na segunda madrugada, era até engraçado ver quatro pessoas de pé a postos para ajudar na mamada e na troca de fraldas.
Com o passar dos dias, fomos nos acostumando também a organizar um rodízio para estes pitstops noturnos. Isso é fundamental, porque para o pequenino colocar duas, três ou quatro pessoas no chinelo é fácil, fácil...

A hora do banho e as trocas de fraldas também são capítulos que nunca se repetem de uma novela às vezes trágica e outras vezes cômica. Quase 100% das vezes que o papai resolve trocá-lo, o André resolve que é mais gostoso fazer xixi com o piu-piu livre de fraldas. Acho que dá mais liberdade, né? E o papai, sendo homem, vai entender isso bem melhor que a mamãe.

continua...

terça-feira, abril 06, 2004

Low tech
Numa daquelas tempestades que caíram em São Paulo no mês passado, um raio penetrou pela corrente elétrica e queimou o meu videocassete.
"Queimou o fusível", pensei.
Que surpresa quando o tiozinho da Assistência Técnica me disse que o modelo do meu video não é dotado de um. O mesmo tiozinho disse também que tentou substituir a peça avariada por duas vezes, mas ela não resiste e queima. Resultado: meu aparelho foi condenado à pena capital.
E aí eu pergunto: alguém ainda compra videocassete nos dias de hoje?
Olha, parece que sim, viu? Pelo menos, considerando-se o preço dos aparelhos... Um videocassete ainda custa, na média, o mesmo que um aparelho de DVD.
Eu, que vinha resistindo ao DVD até hoje, agora fico num impasse. Vale a pena ainda investir uma grana no bom e velho VHS? Eu, particularmente, acho que sim. Principalmente pela quantidade de fitas que eu ainda tenho com lembranças inestimáveis. Além do fato que eu relatei nesse antigo post: eu odeio o dvd! Mas sabe como são essas novas tecnologias, né? Elas se impõem e engolem as velhas.